As doenças da moda
É muito interessante
perceber que existem diagnósticos da moda e fora de moda É muito interessante
perceber que existem diagnósticos da moda e fora de moda. E entre eles, os com
charme e os sem charme. Quando dou palestras e explico os critérios para determinar
se alguém tem déficit de atenção, todo mundo leva as mãos à cabeça e pensa:
“Meu Deus, eu tenho isso”; a mesma coisa acontece com ansiedade e até mesmo
depressão. Já quando explico o que é psicopata e o que é histérica, novamente
tudo mundo se desespera, mas dessa vez pensando: “Meu Deus, meu chefe é um
psicopata” ou “Minha chefe é histérica” – ser deprimido ou desatento vá lá, mas
psicopata ou histérico são só os outros.
Uma busca no acervo
on-line do Estadão mostra um fenômeno curioso: da década de 80 para cá, o termo
“histérica” aparece mais ou menos 15 vezes por ano no jornal, numa taxa
estável. Já o termo “psicopata” subiu das mesmas 15 vezes por ano nos anos 80
para 45 vezes/ano nos anos 90 e chegou a quase 70 vezes/ano nos anos 2000. E só
em 2010 a apareceu em 164 ocasiões no jornal. Já “déficit de atenção” começou a
surgir nos anos 90 no jornal (4 vezes na década), subiu para 5 vezes por ano
nos anos 2000 e em 2010 apareceu 30 vezes.
Arrisco uma explicação
para essas tendências: o diagnóstico de histeria não consta mais dos manuais
médicos desde os anos 80. Ao cair em desuso no meio acadêmico, com o tempo saiu
também de moda entre a população geral. Fenômeno exatamente oposto ao da
psicopatia e déficit de atenção. O primeiro foi resgatado pela academia a
partir dos trabalhos do canadense de Robert Hare, nos anos 70, e após sua
consolidação no meio científico foi sendo incorporado pela sociedade. E o
diagnóstico “transtorno de déficit de atenção e hiperatividade” surgiu com esse
nome no fim dos anos 80, seguindo a mesma via.
O conhecimento científico
normalmente caminha dos periódicos técnicos para os veículos de divulgação de
ciência, desses para a mídia leiga e finalmente ganham a massa. Mas essa é uma
via de mão dupla, como fica claro quando lidamos com o comportamento humano: a psicologia
do senso comum é influenciada pela ciência e ao mesmo tempo em que a influencia
(antes de serem cientistas, os pesquisadores são pessoas). Esse não é o
problema – é bom que saiba-se que doenças existem e podem ser tratadas.
O risco é que nesse
verdadeiro telefone sem fio muitas vezes a informação vai sendo distorcida,
levando a um abismo entre o que os cientistas dizem e o que as pessoas repetem.
E na ânsia de encontrar explicações – e principalmente soluções – para seus
sentimentos e sofrimentos, às vezes as pessoas começam a ver doença onde não
tem, recorrendo remédios inutilmente.
Nesses casos, inverte-se a
recomendação, pois ao persistirem os sintomas vemos que o médico nem deveria
ter sido consultado.
Fonte: blogs.estadao.com.br